Eram dias de sorrisos.
O céu límpido deixava o Sol impor-se, fazer-se rei. Todos os cantos, seus raios abemolados iluminavam, faziam com que tudo fosse belo, fosse claro. O Sol brilhava imponente, espelhado nas águas cristalinas que corriam calmamente. Estava em tudo e todos, no quente das bochechas acanhadas, na cauda alaranjada, brilhante e vívida dos peixes, nos desenhos coloridos dos pequenos, nas bebidas, nos doces, nas novelas, nos sonhos, nas noites… Tudo era quente: a areia de veludo, as pedras brilhantes pregadas ao chão, os abraços, os olhares, os beijos, as pessoas…
Havia uma mulher que para todos sorria, um sorriso puramente gentil, um sorriso pelo singelo prazer de sorrir, que comprimia seus olhos de maneira agradável. Havia um senhor, sempre com seu chapéu cinza claro posto em sua cabeça, sisudo e generoso, galanteava a vista com sua feição doce. Ele era cinza mas irradiava felicidade. Havia um casal que a todo segundo improvisava juras pomposas de amor eterno em versos metrificados, e que demonstravam ter todo o ardor e alegria que neste mundo poderia haver. Haviam crianças que soíam brincar de ciranda, todas penteadas e com meias que até os joelhos chegavam, em suma, impecáveis, contudo apenas no início do dia. Haviam cães que brincavam de pique e balançavam ritmicamente suas caudas. E na gaiola, havia um canário cantando majestosamente.
Eram dias de sorrisos… Eram.
Faz frio. O Sol se pôs junto aos rios densos e sujos; aos desenhos amassados, esquecidos no fundo de uma gaveta qualquer; aos doces que perderam sua doçura e passaram a fazer gargantas arderem. Se foi junto aos sonhos, cada vez mais escassos; junto ao agradável silêncio da noite, que já não dorme mais; junto ao brilho das pedras opacas, que agora lamentam a sorte de estarem pregadas ao chão; junto ao calor dos abraços reconfortantes, que foram substituídos pelo vazio da conveniência. Faz frio, tanto frio…
Hoje, a mulher vende seus sorrisos, tanto vende, todavia não consegue prosperar como prosperara. O senhor cinza virou cinzas, literalmente. Sua doçura austera faz falta, embora ninguém se recorde dele. As crianças se foram, assim, naturalmente. Não existem mais, que não afogadas em uma ou outra vaga lembrança. O casal cedeu aos desatinos gerados pelo simples fato de existirem. Cederam e desistiram, um do outro, e de si mesmos. Sem mais ardor, sem mais alegria, sem mais poesia. Os cães velhos já não se levantam pelas manhãs, alquebrados e taciturnos. Mas na gaiola, mesmo que com uma melodia melancólica, ainda está, ainda existe, o canário a cantar, majestoso, persistente.
Ah, eram dias de sorrisos… E como eram !
Íncrivelmente maravilhoso!Descrição emocionalte, realmente me emocionou de uma forma muito sublime!
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