Banho

   O disfarce: sorriso. Tão gasto que chegava a ser verdadeiro em alguns momentos. Seu sorriso, sua máscara, sua mágica: não fazia com que tudo ficasse bem, mas fazia com que tudo ficasse o mais próximo de “bem” que poderia, ao menos aparentemente. Enganava, entretanto sem malícia.
   A água quente caía sob suas costas e suas lágrimas passeavam sob seu rosto. Tentava afogar-se, mas era fraca: voltava. Desejava ser forte, mas não passava de desejo.
   Por entre seu pranto, tanta água em seu rosto, ela forçava-se a sorrir. Seu disfarce. Não havia ninguém por perto, que ela precisasse enganar. Havia apenas ela e sua tentativa vã de enganar a si mesma. Um ato estúpido, mas alguém como ela, é feito de atos estúpidos.
   E neles ela pensava. E em cada erro. Em cada mentira contada, mentiras tão óbvias, porém imperceptíveis. Talvez por ela mesma acreditar. Ela apenas mentia por que, se contasse a verdade, não acreditariam nela. Ela mentia também quando não existia verdade, ou quando ela não queria que ela existisse.
   Desligou o chuveiro e cumpriu todo seu ritual. Sua rotina. Encarou-se no espelho, seu rosto inchado. Rotina. Coberta, sentada, secava seus cabelos e indagava sobre suas lembranças. Aquela fotografia.
   Uma fotografia. Quando ela se deu conta, ela viu que era tudo o que ela possuía.
   Dos tempos em que todos os dias ele sorria em agradecimento ao sorriso dela, em que ele podia abraçá-la com força, em que o perfume dele fazia-se notar em todos os lugares, vívido, tempos em que o sabor dele estava sempre presente nos lábios dela, em que todas as palavras de amor sincero que partiam dela, eram exclusivamente para ele, e todo o amor por ela que ele carregava no peito, fazia dele um homem completo, tempos em que a felicidade parecia generosa, destes tempos, só restava uma fotografia.
   E uma rotina repleta de rostos inchados e sorrisos forçados.

   Onde ele foi, afinal ? E como ele partira, assim, tão fugaz ?

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