Eu sei, estive mentindo, enganando, ocultando… Estive tentando mascarar a realidade, disfarçar o penar, aliviar a dor, por meio de uma doce e bondosa hipocrisia. Espero que você tenha consciência de que meus atos foram puramente altruístas – menti para você, e para nós, em nome da felicidade. Não uma felicidade verdadeira, mas uma felicidade de qualquer modo, e a felicidade mais feliz e completa que poderíamos ter, dadas as circunstâncias.
   Não sei dizer se me arrependo. Eu lhe entreguei mentiras e deixei que você acreditasse, e já não sei mais se foi proveitoso e correto nos encarcerar em um universo regido de epifanias e sonhos coloridos, agora que estes foram frustrados e essas tornaram-se paranóias.
   O fato de uma mentira ter sido dita com benevolência não muda o fato de que é uma mentira. A princípio, pareceu-me que o melhor a fazer era lhe dar um riso fingido, lhe mostrar falsas alegrias… Contudo, começo a pensar se o preço que agora pagamos por termos ofuscado a verdade e ignorado a realidade e nos escondido do mundo, realmente é justo.
   É irônico que tenhamos aprendido que, determinadas mentiras nos fazem sorrir um sorriso merecido e honesto e que, agora, estejamos como crianças mimadas, aborrecidas por terem sido bruscamente acordadas de seus sonhos mais portentosos.
   Acho que, enfim, posso compreender o motivo de tudo, e lamento. Lamento que nenhum de nós tenha sabido mentir uma boa mentira, que nenhum de nós tenha sabido enganar como se deve.

[25.10.2010]

Comentários

  1. A doce ironia da mentira,achei simplesmente espetacular

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  2. E a mentira durasse por muito tempo, talvez um dia ao acordar perceba-se como o teatro se tornou monotono e a mentira se torna farta para ser sustentada.... quem sabe?

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